domingo, 1 de março de 2009

Fala do Trono de 1826

FALA QUE SUA MAJESTADE O IMPERADOR PRONUNCIOU NA CÂMARA DOS SENADORES, NO DIA 6 DE MAIO DE 1826, NA ABERTURA DA ASSEMBLEIA NACIONAL.

Augustos e digníssimos representantes da nação brasileira. Pela segunda vez tenho o prazer de apresentar-me entre vós abrindo a assembléia nacional. Sinto infinito que ela se não abrisse no dia marcado pela constituição, depois de o governo ter concorrido da sua parte quanto pode, para que a lei não fosse postergada. Em doze de novembro de mil oitocentos e vinte e três, dissolvi a assembléia constituinte, bem a meu pesar, e por motivos que vos não são desconhecidos.

Prometi ao mesmo tempo um projeto de constituição; este foi aceito e jurado, e hoje é a constituição política, que rege este império, e em virtude da qual se acha reunida esta assembléia. A harmonia que se pode desejar entre os poderes políticos, transluz nesta constituição do melhor modo possível. Todo o Império está tranqüilo, exceto a província da Cisplatina.

A continuação deste sossego, a necessidade do sistema constitucional, e o empenho que eu tenho, que o Império seja regido por ele, instam a que haja tal harmonia entre o senado e a casa dos deputados, entre esta e aquele, e entre o governo e ambas as câmaras, que faça com que todos se capacitem, que as revoluções não provém do sistema, mas sim daqueles que à sombra dele buscam por em prática os seus fins particulares.

A província da Cisplatina é a única que não está em sossego, como eu já disse, pois homens ingratos, que muito deviam ao Brasil, contra ele se levantaram, e hoje se acham apoiados pelo governo de Buenos Aires, atualmente em luta contra nós. A honra nacional exige que se sustente a província Cisplatina, pois está jurada a integridade do Império.

A independência do Brasil foi reconhecida por meu augusto pai, o senhor D. João VI, de gloriosa memória, no dia quinze de novembro do ano próximo passado, seguiram-se a Áustria, a Inglaterra, a Suécia e a França, tendo-o sido muito antes pelos Estados Unidos da América.

No dia 24 de abril do ano corrente, aniversário de embarque de meu augusto pai o senhor D. João VI, para Portugal, recebo a infausta e inopinada notícia da sua morte: Uma dor pungente se apodera do meu coração; o plano, que devia seguir, achando-me, quando menos o esperava, legítimo rei de Portugal, Algarves, e seus domínios, se me apresenta repentinamente; ora a dor, ora o dever ocupam o meu espírito. Mas pondo tudo de parte, olho os interesses do Brasil, atendo à minha palavra, quero sustentar minha honra, e delibero, que devia felicitar Portugal, e que me era indecoroso não o fazer.

Qual seria a aflição, que atormentaria minha alma buscando um meio de felicitar a nação portuguesa, não ofendendo a brasileira, e de as separar (apesar de já separadas) para nunca mais se poderem unir? Confirmei em Portugal a regência, que meu pai havia criado; dei uma anistia, dei uma constituição; abdiquei e cedi de todos os indisputáveis e inauferíveis direitos que tinha à coroa da monarquia portuguesa, e da soberania daqueles reinos na pessoa da minha muito amada e querida filha a princesa D. Maria II. È o que cumpria fazer a bem da minha honra e do Brasil.

Agora conheçam (como já deviam conhecer) alguns brasileiros ainda incrédulos, que o interesse pelo Brasil, e o amor da sua independência é tão forte em mim, que abdiquei da coroa da monarquia portuguesa, que me pertencia por direito indisputável, só porque para o futuro poderia comprometer os interesses do mesmo Brasil, do qual sou defensor perpétuo.

Deve merecer-vos sumo cuidado a educação da mocidade de ambos os sexos, a fazenda pública, todos os mais estabelecimentos públicos, e principalmente a factura de leis regulamentares, assim como a abolição de outras diretamente opostas à constituição; para por esta nos podermos guiar e regular exatamente.

A maior parte dos senadores e deputados que compõem esta assembléia, bem lembrados devem estar dos males, que alguma nações tem sofrido, provenientes da falta de respeito às autoridades constituídas, quando estas são atacadas e menoscabadas, em vez de serem acusadas e processadas conforme a lei, e de justiça universal. Bem sei que estas minhas reflexões não são necessárias a esta assembléia, composta de tão dignos senadores e deputados; mas servem a satisfazer o zelo, amor e interesse que realmente tenho ao Império do Brasil e pela execução da constituição. Muito mais teria a recomendar-vos, mas parece-me não o dever fazer.

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